Da nostalgia do Opalão à era dos SUVs: a história da Stock Car brasileira
- Carlos Rossi | Kabé
- 2 de mai.
- 7 min de leitura
Atualizado: 3 de mai.

Categoria celebra trajetória que vai de 1979 até a revolução de 2025, com mudanças tecnológicas, expansão internacional e disputas cada vez mais acirradas
Categoria mais tradicional do automobilismo brasileiro passa por revolução em 2025 e segue acelerando com história, inovação e muita paixão nas pistas
Foi em 1979, inspirado pela mítica NASCAR americana, que o Brasil viu nascer a sua própria versão das corridas de turismo: a Stock Car. O cenário foi o Autódromo de Tarumã, no Rio Grande do Sul, onde dez carros de passeio, com mecânicas semelhantes, alinharam para a primeira largada oficial. A iniciativa partiu da Associação Brasileira de Revendedores Chevrolet, dando início à principal categoria do automobilismo nacional.
Desde então, são mais de quatro décadas de velocidade, rivalidades, evolução tecnológica e presença marcante no imaginário popular. A cada década, a Stock Car se reinventou, e em 2025, pisa fundo no acelerador rumo ao futuro, ao adotar SUVs como protagonistas das corridas e implementar uma série de avanços técnicos que transformam a competição em um verdadeiro espetáculo de engenharia e entretenimento.
Anos 1980 – Crescimento e paixão nacional
Os anos 1980 foram fundamentais para a consolidação da Stock Car como paixão nacional. A categoria passou por uma fase de aprimoramento técnico: os carros evoluíram, ficaram mais rápidos e passaram a incorporar sistemas de segurança que antes eram impensáveis no automobilismo nacional. Com isso, o público respondeu em peso — as arquibancadas viviam lotadas, e as provas chegavam a reunir cerca de 50 mil torcedores, um verdadeiro fenômeno de audiência.
Em 1982, a Stock Car deu um passo ousado e histórico ao realizar, de forma extraoficial, sua primeira corrida fora do Brasil. O destino foi o autódromo de Estoril, em Portugal. A prova marcou um momento simbólico: pela primeira vez, uma categoria nacional acelerava em solo estrangeiro — e quem levou a melhor foi Paulo Gomes, reforçando a força dos pilotos brasileiros também além-mar.
Os grids foram ficando cada vez mais cheios e competitivos, reunindo alguns dos maiores talentos do automobilismo nacional. A Stock Car se firmou de vez como o principal palco das corridas no Brasil, atraindo cada vez mais atenção e respeito do público e da mídia. E, fechando os anos 1980 com chave de ouro, surgiu um nome que se tornaria sinônimo da categoria: Ingo Hoffmann. Em 1989, ele deu início a uma era de domínio absoluto, pavimentando o caminho para uma sequência impressionante de títulos.
Anos 1990 – A era de ouro de Ingo Hoffman
Se o fim dos anos 1980 anunciou o surgimento de uma nova lenda nas pistas, a década de 1990 tratou de consagrá-la. Ingo Hoffmann, que já mostrava seu talento no final da década anterior, dominou completamente os anos 90 e cravou seu nome na história da Stock Car. Foram oito títulos no total — seis deles consecutivos — que transformaram o piloto em sinônimo da categoria.
Durante esses anos, a Stock Car também passou por uma renovação importante. A General Motors intensificou seu apoio e impulsionou a criação da Fórmula Chevrolet, uma categoria-escola que revelou novos talentos. Ao mesmo tempo, o Opala ganhou uma repaginada, ficando com visual mais moderno até ser substituído pelo Omega, em 1994, como carro oficial das corridas. Mesmo fora das pistas principais, o velho "Opalão" seguia cultuado por uma legião de fãs nostálgicos, apaixonados por seu ronco grave e presença imponente.
Enquanto isso, Hoffmann não dava trégua. Ao lado do parceiro Ângelo Giombelli, conquistou o tricampeonato entre 1991 e 1993 com domínio absoluto. A sequência só foi quebrada por Paulo Gomes em 1995 e depois por Chico Serra no fim da década, mas o estrago já estava feito: Hoffmann transformou sua regularidade e talento em legado, escrevendo com pneus e coragem uma das passagens mais gloriosas da história da categoria.
Anos 2000 – Tecnologia, internacionalização e o surgimento da Corrida do Milhão
O início dos anos 2000 marcou uma verdadeira revolução na Stock Car. Em vez dos antigos carros de rua adaptados, os bólidos passaram a ser construídos sob medida para correr. Saiam de cena os modelos convencionais, e entravam os carros de chassi tubular, desenvolvidos especialmente para competição, graças ao projeto liderado pela JL, empresa do ex-piloto Zeca Giaffone. Era o começo de uma Stock Car mais profissional, moderna e robusta.
Em 2003, a potência dos carros foi para outro nível com a adoção dos motores V8 importados dos Estados Unidos — os famosos "oito canecos". Outro aspecto relevante dessa época foi que a categoria deixava de ser monomarca e abria espaço para novas montadoras além da tradicional Chevrolet. Peugeot, Mitsubishi e Volkswagen passaram a figurar no grid, tornando as disputas ainda mais equilibradas e imprevisíveis.
O avanço tecnológico não parava por aí. Foi nessa década que as equipes começaram a utilizar telemetria veicular, um recurso que permite a coleta de dados em tempo real sobre o desempenho dos carros. Essa inteligência eletrônica transformou o modo como se fazia estratégia dentro dos boxes, aproximando a Stock Car do que há de mais moderno no automobilismo internacional.
Com tanto investimento e evolução, o campeonato crescia também em números. Em 2005, o grid chegou a impressionantes 40 carros, consolidando a categoria como um fenômeno nacional. Nesse mesmo ano, a Stock atravessou fronteiras novamente, com uma corrida especial realizada em Buenos Aires, na Argentina.
Em 2008 veio um dos marcos mais icônicos da categoria: a estreia da Corrida do Milhão, que oferecia ao vencedor um prêmio de 1 milhão de dólares. A prova, disputada no Autódromo de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, ficou nas mãos de Vladeno Brito Filho — um nome que entrou para a história da Stock em grande estilo.
A década foi encerrada com outra inovação de impacto: em 2009, os circuitos de rua foram incorporados ao calendário oficial, levando a adrenalina das corridas para dentro das cidades e aproximando ainda mais o público da emoção da Stock Car.
Anos 2010–2020 – Consolidação como principal categoria da América do Sul
Na década de 2010, a Stock Car atingiu um patamar de maturidade e competitividade raramente visto no automobilismo brasileiro. O grid reunia lendas e revelações do esporte: nomes que já haviam passado pela Fórmula 1, como Rubens Barrichello e Felipe Massa, passaram a dividir curvas com jovens talentos em ascensão, fazendo de cada largada um espetáculo imprevisível e tecnicamente elevado. Era a elite das pistas brasileiras duelando roda a roda, com uma constância de performance que elevava o nível da categoria a cada temporada.
Em 2020, no olho do furacão da pandemia, a Stock Car encarou uma reformulação profunda. Os carros mantiveram a tradicional estrutura com chassi tubular, mas passaram a utilizar o monobloco de modelos de rua, aproximando ainda mais o visual das pistas da realidade das concessionárias. Essa mudança não foi apenas estética — ela gerou maior identificação com o público e acirrou a rivalidade entre montadoras. A Chevrolet, com o Cruze, que já competia desde 2016, ganhou a companhia da Toyota, que trouxe o Corolla para a briga. Resultado? Um duelo feroz e equilibrado que injetou ainda mais emoção nas provas.
O período também marcou uma fase de reorganização fora das pistas. Embora a pandemia tenha trazido desafios logísticos e sanitários, a Stock Car resistiu e se manteve firme no calendário do automobilismo nacional. Durante esse processo, foram traçadas diretrizes estratégicas que lançariam as bases para o futuro da categoria — incluindo o audacioso plano que culminaria na transição para os SUVs, a partir de 2025.
A alternância de campeões neste ciclo mostra o nível altíssimo de competitividade: Ricardo Maurício levou o título em 2020, seguido por o jovem talento Gabriel Casagrande em 2021 e novamente em 2023, com Rubens Barrichello triunfando em 2022. A Stock não era mais só um celeiro de pilotos — era um campo de batalha para os melhores do país, onde só os mais consistentes chegavam ao topo.
Essa década encerrou-se com um sentimento claro: a Stock Car havia se consolidado como a principal categoria de turismo da América do Sul, pronta para dar seu próximo salto evolutivo.

SUVs na pole e o futuro já começou (2025)
A Stock Car de 2025 traz uma revolução para o automobilismo, com a entrada de SUVs no grid e um avanço tecnológico impressionante. A nova geração de carros é fruto de um projeto inovador da Audacetech, em parceria com ArcelorMittal, IPT e SENAI, e visa elevar o nível de performance e segurança nas pistas.
O motor turboalimentado de 2,1 litros, com cerca de 500 cv de potência, é alimentado por gasolina Podium, garantindo um desempenho de tirar o fôlego. A suspensão independente com triângulos sobrepostos (“duplo A”), equipada com amortecedores reguláveis da Penske Racing, oferece uma aderência superior, permitindo que os carros se comportem de forma mais estável e ágil nas curvas, proporcionando maior controle aos pilotos.
No câmbio, o modelo XTrac de competição, sequencial e semiautomático, conta com seis marchas e se destaca pela precisão nas trocas de marcha. A conectividade foi elevada a outro patamar com o sistema Qualcomm Snapdragon 5G, que integra sensorização avançada para monitoramento em tempo real de várias funções do carro, entregando dados cruciais às equipes.
A carroceria dos carros foi construída com materiais compostos de última geração, como fibra de carbono, aramida, fibra de vidro e kevlar, fabricada pela Magna, o que a torna mais leve e resistente. As rodas, desenvolvidas pela Mangels, abrigam discos ventilados HipperFreios, pastilhas Cobreq e pinças da AP Racing com um sistema de frenagem de alto desempenho, essencial para a velocidade e segurança nas paradas.
O cockpit também foi repaginado, oferecendo aos pilotos um volante de direção da Grid Engineering e um painel digital com monitor, que exibe várias funções em tempo real. Além disso, uma câmera interna de 360 graus proporciona uma visão completa durante as corridas e será usada nas transmissões ao vivo e no novo aplicativo exclusivo da Stock Car, permitindo aos fãs acompanhar os detalhes das corridas de uma forma inédita.
Com três marcas de peso disputando o topo e tecnologia de ponta embarcada em cada centímetro dos carros, a Stock Car 2025 não só muda de visual — ela muda de era. O futuro já começou, e ele corre de SUVs.
Carlos Rossi - Kabé | Red Line Motor Sport
Jornalista | Repórter Fotográfico
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